Digestão anaeróbia - rota seca ou rota úmida

Tempo de leitura: aproximadamente 10m33s

Na produção de biogás, qual é o conceito de rota seca ou rota úmida? Quais são as vantagens e desvantagens desses dois processos?

Digestão anaeróbia - rota seca ou rota úmida
Digestão Anaeróbia seca (dry) ou úmida (wet)
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Conceitos
Dry ou Wet

Sistemas de Digestão Anaeróbia rota seca (dry) ou rota úmida (wet)

Afinal, o que é digestão anaeróbia seca e úmida?

Antes de responder essa pergunta, é importante destacar alguns conceitos.

Esta classificação está diretamente relacionada com o teor de sólidos totais e o teor de umidade presentes no substrato.

Basicamente, "sólido total" corresponde a massa de matéria seca (matéria orgânica e inorgânica sem a presença de água) presente no substrato que é destinado para a produção de biogás.



No substrato

  • Quanto maior o teor de sólidos totais menor será o teor de água.
  • Quanto menor o teor de sólidos totais maior será o teor de água. 

Nos substratos, o teor de sólido total pode variar conforme tipo de resíduo orgânico:

  • De um lado temos alguns efluentes rico em matéria orgânica que podem possuir teor de sólidos totais entre 1 e 2%, ou menos;
  • No outro extremo estão os substratos com elevado teor de lignocelulose, como as palhadas e gramíneas geradas na agricultura, o bagaço da cana-de-açúcar gerado na indústria sucroalcooleira e os pellets (cilíndrico elaborado a partir de resíduos prensados de madeira), que são biomassa com teor de sólidos totais que podem chegar acima de 80%;
  • Restos de comida das nossas casas e a fração orgânica de resíduos sólidos urbanos (RSU) possuem um valor médio de 22% de teor de sólidos totais, podendo variar entre 15 até 30%. 

Figura 1 - Composição do substrato: massa seca (sólido total) e água (umidade)



No processo de digestão anaeróbia

Em qualquer projeto de reator anaeróbio o ponto fundamental está relacionado diretamente com a velocidade das reações (cinética das reações bioquímica do processo), ou seja, a eficiência da remoção da carga orgânica do substrato e a sua conversão em metano.

A configuração adequada de reator para cada tipo de substrato tem por finalidade promover a mistura e um fluxo que favoreça o contato do substrato orgânico com os micro-organismos.

Os micro-organismos anaeróbios são os principais agentes da dinâmica do processo de digestão anaeróbia e por isso não basta apenas estarem em um ambiente com as condições adequadas (sem a presença de oxigênio atmosférico) para que se desenvolvam, também é necessário prover condições para que as características hidráulicas do reator favoreçam o contato direto do substrato (alimento) com os micro-organismos anaeróbios.

Desta forma, o teor de sólidos totais do substrato é um dos parâmetros que influenciam diretamente na decisão sobre qual processo será adotado (digestão anaeróbia rota seca ou úmida), assim como nas especificações direta do reator anaeróbio.

Existem alguns tipos de processos de digestão anaeróbia para o tratamento de resíduos orgânicos:

  • Sistemas de digestão anaeróbia úmida - que usam matéria orgânica com consistência de 10 a 20% de matéria seca ou menos;
  • Sistemas de digestão anaeróbia seca - para matéria orgânica com consistência de 20 a 40% de matéria seca ou mais;
  • Sistema de digestão anaeróbia extra seca - opera em reatores com elevado teor de sólidos, 35 a 50%, em operação descontínua e regime de bateladas sequenciais.

A escolha para adotar um sistema de digestão anaeróbia seca ou úmida para a produção de biogás depende diretamente do teor de matéria seca (sólido total) do substrato ou da possibilidade de diluição com a adição de um segundo substrato rico em água, como efluentes líquidos.

Vantagens e Desvantagens do Sistemas de digestão anaeróbia seca e úmida, de acordo com BiogasWorld

1. Vantagens e Desvantagens da Digestão Anaeróbia Seca

A digestão a seco aplicada em escala real pode ser realizada em um sistema contínuo ou descontínuo . A digestão seca é chamada de descontínua porque a produção de biogás é sequenciada com as fases de carga e descarga. Vários biodigestores irão operar em paralelo e permitir uma produção constante de biogás ao longo do tempo.

A digestão anaeróbia seca é uma solução alternativa para a digestão anaeróbia úmida, a fim de otimizar o valor do esterco. Na verdade, uma planta de digestão anaeróbia úmida é bastante limitada para o tratamento de substrato à base de matéria seca. Os sistemas de digestão anaeróbia seca permitem o uso de substratos com alto teor de resíduos de colheita, lixo doméstico e esterco de gado.

1.1. Aqui estão algumas características e vantagens da digestão anaeróbica seca:

  • Matéria seca / sólidos totais 20-40% em comparação com 20% no máximo para digestão úmida;
  • Baixo consumo de energia e necessidades de calor;
  • Sistema muito tolerante a contaminantes (areia, fibras, partículas grandes, etc.);
  • Possibilidade de usinas móveis de biogás (contêineres);
  • Gestão de vários biodigestores simultaneamente;
  • Equipamentos menos críticos (bombas, sistemas de agitação, equipamento de alimentação);
  • Produção de digestato sólido aplicado na terra semelhante ao estrume;
  • Pouca água no processo;
  • Menor demanda de manutenção dos equipamentos;
  • Sistema com complexidade menor em comparação com sistemas anaeróbios úmidos;
  • Possibilidade de uso de vários substratos por unidade de biodigestores;

1.2. Desvantagens:

  • Tecnologias especiais para carga e descarga do digestor são necessárias;
  • Necessidade de gerenciar a variação de biogás e produção de calor;
  • O substrato não totalmente misturado (não homogêneo);
  • Em sistemas descontínuos, o processo microbiano deve começar para cada lote. Ou seja, maior tem para iniciar a partida dos biodigestores (startup lento);
  • Em muitos casos, rendimentos mais baixos de metano em comparação com sistemas anaeróbios úmidos;

1.3. Critérios de Sucesso para Projetos de Digestão Anaeróbia Seca

  • Substrato suficiente (pelo menos 2.000 toneladas de estrume);
  • Espaço disponível para a construção da planta (no mínimo 600 m² apenas para biodigestores);
  • Possibilidade de usar o calor em uma instalação próxima;



2. Vantagens e Desvantagens  da Digestão Anaeróbica Úmida

Existem boas razões para processar biomassa seca em um digestor úmido. A principal vantagem da digestão anaeróbia úmida é que ela permite a mistura ideal e, portanto, uma alta produção de biogás. Os custos de investimento e operacionais são menores do que os do sistema de digestão anaeróbia seca. A fermentação da matéria seca em um digestor úmido apresenta o risco de separação entre as partículas inertes que fluem e as mais leves que permanecem na superfície.

2.1. Vantagens da digestão anaeróbica úmida em comparação com a digestão seca:

  • Maior flexibilidade nos materiais a serem tratados;
  • Baixo investimento e custos operacionais;
  • Dessulfurização biológica integrada;

2.2. A digestão anaeróbica úmida apresenta as seguintes restrições:

  • É necessário adicionar líquido para reduzir a matéria seca da mistura;
  • Requer equipamento de mistura robusto e caro;
  • Requisitos de energia significativos da instalação para operar bombas e agitadores;
  • Menor teor de matéria seca para o digestato;

Produção de digestato úmido que pode modificar as práticas de aplicação no solo e levar a investimentos adicionais (em alguns casos necessidade de lagoas de decantação, estabilização, polimento ou simplesmente uso de prensa desaguadora);



Considerações Finais

De acordo com BiogasWorld, recomenda-se o uso de um sistema de digestão anaeróbia seca quando a biomassa introduzida contiver mais de 10% de areia ou uma grande quantidade de materiais não degradáveis, como materiais sintéticos. O sistema seco é mais adequado para biometanização da fração orgânica dos resíduos sólidos urbanos que não foram separados na fonte de geração.

Quanto aos custos na Europa, as instalações de digestão anaeróbia seca são um pouco mais caras do que as instalações de digestão anaeróbia úmida. Para pequenas fábricas, é cerca de 500.000 a 1 milhão de euros. A maior parte do investimento é gasta na construção civil e nas estruturas de concreto. O investimento varia muito dependendo dos materiais usados.

Referências

Referências bibliográficas consultadas:

  • AIRES, A. M.  Desenvolvimento de um sistema para o pré-processamento da cama de frangos de corte destinada a biodigestão anaeróbia e compostagem “IN-VESSEL”. 2012. 143f. Tese (Doutorado em Zootecnia) UNESP – Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Jaboticabal, 2012.

  • ANGELIDAKI, I.; ELLEGAARD, L.; AHRING, B. K. Applications of the Anaerobic Digestion Process. In: Ahring, B. K. Biomethanation II, Advances in Biochemical Engineering/Biotechnology. Denmark: Springer Berlin Heidelberg, 2003. Volume 82, 2003, pp 1-33.  ISBN 978-3-540-44321-6. doi: 10.1007/3-540-45838-7_1

  • CARDOSO, Fernanda; BORSCHIVER, Suzana. Technology Roadmap da Biometanização da Palha. Cadernos de Prospecção, v. 11, n. 5, p. 1596, 2018.

  • GOMES, Felipe Correia de Souza Pereira. Biometanização Seca de Resíduos Sólidos Urbanos – Estado da Arte e Análise Crítica das Principais Tecnologias. 2010, 164 fl. Dissertação (Mestrado em Sustentabilidade Socioeconômica e Ambiental) UFOP – Universidade Federal de Ouro Preto, Ouro Preto – MG, 2010.

  • GOMES, Felipe Correia de Souza Pereira; AQUINO, Sérgio Francisco de; COLTURATO, Luis Felipe de Dornfeld Braga. Biometanização seca de resíduos sólidos urbanos: estado da arte e análise crítica das principais tecnologias. Engenharia Sanitaria e Ambiental, v. 17, n. 3, p. 295-304, 2012.

  • MATA-ALVAREZ, J.; MACÉ, S.; LLABRÉS, P. Anaerobic digestion of organic solid wastes. An overview of research achievements and perspectives. Review paper. Bioresource Technology, Volume 74, Issue 1, August 2000, Pages 3–16.doi: 10.1016/S0960-8524(00)00023-7

  • MARJOLAINE. State-of-the-art Dry and Wet Anaerobic Digestion Systems for Solid Waste. BiogasWorld, April 2021. 




Para explorar outros conceitos, acesse o nosso Glossário.

Acesse também Biogás no Brasil.

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  • VALKERSON LEMES ZACARKIM
    VALKERSON LEMES ZACARKIM
    Excelente conteúdo. Parabéns!
    3 meses atrás Responder
  • António M Gonçalves
    António M Gonçalves
    Artigo interessante, mas difícil de digerir à primeira leitura :)
    2 anos atrás Responder
    • Olá António, concordo com você. Foi um desafio organizar uma síntese de uma pauta tão complexa. Em breve teremos novas publicações sobre esse tema, com um enfoque mais didático.
      2 anos atrás